segunda-feira, 30 de agosto de 2010

A entrega dos sentidos...


Mãos para tocar
Pés para andar
Olhos para observar
Boca para beijar
Coração para amargurar
a textura do que não foi sentido,
o chão que não foi pisado,
o pôr-do-sol que não foi visto,
o sabor que não foi degustado,
o momento que não foi vivido...
Mãos para acariciar
Pés para caminhar
Olhos para admirar
Boca para desejar
Coração para amar...
E com os ouvidos?
Com o ouvido apreciar
o som da música no ar
Ver cada poro meu dançar
Minha alma cantar...
De mim sair
Outros toques sentir
Por novos caminhos viajar
Em outras direções seguir
Mais alegremente sorrir
Com a vida me encantar
me apaixonar
me traduzir
me deslumbrar
me seduzir
E na entrega
descobrir
que amei
que vivi!

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Solilóquio...


Sol...
Solto...
Solidário....
Solícito...
Solstício,
Solda os pedaços...
Solta da prisão...
Solve a escuridão...
Soluciona a sombra...
Aquece e inflama
o ser
que se derrama
de tanto querer-te
Chama....
de tanto querer-te
Amor...




segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Querer...


Querer significa falta
falta não significa querer...
O querer só se materializa na ação
e agir é arriscar-se.
O homem se protege do risco...
Por quê?
Por que já se acostumou com a falta?
Por que tem uma vontade rasa?
Não se tem resposta,
são poucas as perguntas que as tem.
Pessoas em seus variados ciclos existênciais
Cada um vive o seu momento particular
Quando um quer, o outro ignora
Quando o outro se encanta, o um se apavora...
Roda gigante, cada um numa ponta
Desencontros nos possíveis encontros
Namoros ficcionais
Casamento atrofiando a relação
no pleno laboratório da convivência...
O encontro impossibilitando o encontrar!
Isso só é possível porque é vida
Vida viva, dinâmica, transformadora
Vida gerando vida...
pela dor, pelo choro, pela crise
crise do ser, do ter, do conviver
Crise do não saber, do conhecer, da clareza
Crise de não querer o querer...

domingo, 22 de agosto de 2010

A vida em trânsito...


Trânsito brasiliense
lento, solitário, parado, impessoal
luzes no retrovisor
muitos farois
os carros passam na faixa lateral
só o meu carro está parado...
Ando um pouco
Não demora para o freio de mão
ser mais uma vez acionado
Alguns carros querem passar para a direita
Outros seguem pela esquerda
Alguém tem de freiar
abrir passagem
Exercer gentileza...
Uma pessoa em cada veículo
Nada de caronas
Cada um com seu som
Cada um com a sua vida
Seguindo um caminho individual
Ora pegando um atalho
Ora buscando uma trilha tradicional...
No engarrafamento
Um motorista prefere o ponto morto
Outro, com sangue quente,
pisa resignado no freio e na embreagem, tem pressa.
Escolhas...
Mal sabe que vida é sinônimo vivo de transformação
O trânsito lento vai voltar a fluir
O solitário motorista vai chegar a seu destino
Esperar pelo novo dia
e pelo próximo engarrafar
pelas horas perdidas
em seu caminhar
No passar dos dias perceberá
que ação gera sentimento
e que num momento o sol nasce
mas depois nasce o luar
Que, por sua vez, ao amanhecer
devolve ao sol o seu lugar...
O trânsito agora lento
começará a descongestionar
Em questão de tempo
Já poderás partir
pra família voltar
Cantar alto, sorrir
descansar, se alimentar
Dormir agarrado no sonho
Pra com ele despertar
E denovo decidir
que vai ser feliz
mesmo quando um engarrafamento surgir
mesmo que a dificuldade insistir
em chegar, em ficar...
Trânsito.


sábado, 21 de agosto de 2010

Maria se encontra no Clube do Choro de Brasília...


Maria acordou com um novo desejo. Gostou tanto da novidade que é sair só que resolveu mais uma vez se aventurar. Dessa vez escolheu o Clube do Choro de Brasília. Pensou em uma rápida definição: seria um lugar onde as pessoas se reúnem para chorar? Será? O por quê desse nome? Não poderia ser clube da música? Do violão? Da batucada? Ah... não! Não poderia obter essa resposta, a menos que fosse conferir com os próprios olhos. O coração chegou primeiro. Acelerado. Batendo forte. Estacionou o carro e foi até a bilheteria. Fila. Via muitas pessoas acompanhadas, e, sorriu de satisfação. Estava fazendo diferente. Sabia que precisava mesmo romper com as velhas companhias solitárias. Ela queria o mundo. Com todas as suas saborosas cores, com todos os sons, os perfumes e os bichos. Precisava estar só consigo. Inclusive com os próprios bichos. O ingresso indicava a mesa de número 45. Chegou sucumbindo em timidez, para tomar posse de uma das quatro cadeiras disponíveis. Isso mesmo. Sentaria ao lado de três pessoas desconhecidas. Com o ingresso e o coração na mão, mais uma vez, conferiu o número da mesa para não dar vexame. Quando olhou o lugar se surpreendeu: Se sentiu no Rio de Janeiro da década de 50. Estrutura circular, mesas rodeando o palco, garçons, pessoas de diversas faixas etárias. Meia luz. Palco vibrante. Cheiro de História. Depois de avistar a mesa, se aproximou, cumprimentou os colegas e sentou-se. Não pôde acreditar quando enfim se acomodara. Parecia ter passado uma eternidade até aquele momento. A casa estava cheia. A Spok Orquestra iria tocar. Até então, não sabia o que significava a palavra Spok. Um músico, uma banda, um instrumento? Digamos que ele era tudo isso. O Spok do frevo jazz. O Spok de Pernambuco. O Spok da alegria do frevo ou do frevo da alegria? Não importa. Simplesmente Spok. Um músico, um maestro, o comunicador de sentimentos.

Sim, meus caros leitores, Maria foi ao clube do choro para ouvir choro, e acabou ouvindo Frevo Jazz da mais alta qualidade. A cada música uma aula à parte. Aquele lugar estava cheio de Pernambucanos, com cara e clima de Rio de Janeiro, era o nosso Brasil. Maria e a música do nosso Pernambuco Brasileiro. Sorria, se emocionava, vibrava, batia palmas. Diálogo vibracional. Um surpresa no palco: Jorge Marino, a representação do frevo em Brasília, subiu naquele santuário musical para dançar frevo, com todas as cores do seu mini guarda-chuva. Jorrando energia. Caindo. Pulando. Vivendo. Bela homenagem. Ele é uma homenagem viva para a vida! 70 anos de homenagens dançadas, puladas, sorridas.

Intervalo. Fez-se um silêncio desejoso de ser quebrado pelo Sax Spokiano. As luzes voltaram a acender. O tempo parou. O palco renasceu. Burbúrios nas mesas. Maria queria para alí. Se fixar. Se concentrou numa tentativa de eternizar aquele momento: um, dois, três. Não adiantou, a vida continuou a girar. O relógio nunca pára. A vida não parou. A orquestra não queria parar de tocar. Spok tocou uma sequência que contagiou a platéia de tal forma que todos se levantaram e começaram a cantar e dançar. Marchinhas deliciosamente cantadas de forma uníssona. Hinos. De celebração fez-se o clima daquele lugar. Alguém comentou que fazia muito tempo que o clube do choro não sacudia daquela forma. Maria ouvindo, pensou: Estreia. Era a estreia dela naquele universo. Se sentiu presenteada. Inundada de sentimentos musicais. Chegou só, mas de volta pra casa, nunca sentiu sua alma tão bem acompanhada.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Quarta-feira de dor...


Fácil falar da dor...
Difícil é sentí-la...
Fácil falar que vai passar...
Difícil é esperar esse momento...
Fácil explicar que tudo é passageiro
como a chuva
como o frio
como o vento
como o tempo...
Difícil é viver desse modo tão atemporal
Difícil ser resistente a tanta mudança semestral,
mensal,
diária...
Um minuto
e o dia acabou,
Um minuto
e a oportunidade passou,
Um minuto
e o céu escureceu,
Um minuto
e o que era bom se perdeu...
Todos os dias
pra treinar o desapego
pra perder o medo
de perder...
Todos os dias
pra aprender a lição:
o que aconteceu ontem
está do outro lado da ponte
que já caiu...
Não se tem mais acesso
Querer voltar e refazer, impossível
Já está no tempo passado, inacessível
O que aconteceu ontem, imutável...
Não é fácil,
mas é preciso desse passado se desapegar
Dos fatos,
apenas absorver o impacto e logo o canalizar
Da desconstrução,
recolher os cacos
e quantas vezes for necessário
bater a poeira, olhar pra frente
pra um novo modo de viver, reiventar...
Choro, desespero
dor, tristeza
Fazem parte de um todo:
Vida.
Viver é correr o risco de sentir dor...

Dia nublado


Quando os questionamentos
invadem a cabeça
paira a dúvida:
que caminho é esse que estou percorrendo?
Quando a tristeza
invade o coração
vem a pergunta:
até quando continuarei sofrendo?
Perda, morte, embaraço
dor, agonia, cansaço
luta diária
contra uma dor que não passa.
Por que não passas dor?
dê uma trégua pra minha alma
deixe-me girar... preciso girar...
tire essas nuvens do meu céu
não quero sentir mais esse gosto de fel
não quero mais me entristecer e chorar...
Por favor,
dor...
Tire essas nuvens do meu céu...
Deixe o meu sol aparecer
Eu preciso me alimentar
me nutrir, me recuperar
pra amanhã me abrir
florescer
me alegrar...


segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Derramamento...


O derramar da vontade

em mim aconteceu

quando a minha boca te conheceu

e o meu corpo iniciou uma busca pelo teu...

O derramar da vontade

em mim se iniciou

quando a nossa pele se encontrou,

contrariando qualquer senso de realidade...

Quando eu te enxerguei

O derramar da vontade

quis me invadir

sem resistência eu fiquei

diante do nosso sorrir...

Quando eu dei por mim

somente ao som da sua voz eu queria dormir

sonhava que minha pele com a sua se encantava

e que em mim a necessidade morava

num pleno e intenso fluir...

Quando eu me apaixonei

pela nossa arte

estávamos eu e você escrevendo poesia

e descobri que de mim você era a parte

que outrora não tinha...

Mas o derramar do copo cessou

Agora o copo está apenas cheio

não derrama mais

Pra não esquecer a efemeridade

não derrama mais

Pra lembrar que tudo tem data de validade

não derrama mais

Pra mostrar que a troca mútua já foi realizada

não derrama mais

como uma constatação de que a missão desse amor já foi cumprida

logo veio a verdade

a vontade está viva, apenas não derrama mais...




domingo, 1 de agosto de 2010

Lua loura


Lua

Lua linda

Lamparina lunar

Leia-me

Limpe-me

Lua loura

Leve daqui todo pesar

Lascívia, lamento

Loucura, luto

Leve...

Lua límpida

leia-me

literalmente

literareamente

lave-me

com seus banhos de luar...

ensina-me

a ser como você:

densa e leve

clara e forte

crescente, minguante

nova, cheia

capaz de flutuar...

Sinestesia


Estesia

sentimento, sensações, emoções

para viver o todo

para não se resguardar do risco de ser feliz

para nao ficar adormecido

para ser pleno

choro e riso.

Abaixo a anestesia!

Não paralisar as possibilidades

pra fugir da dor

Não anestesiar a vida

para deixar de pagar o ônus intrínseco.

Fugir da estesia é sinônimo de suicídio

Ser moribundo no paraíso

Rico sem comida

Justiça sem juízo

Amor sem amar.

Diga sim à vida

sim à dor e à alegria

SINestesia...

Maria e a dança, um encontro.


Maria se decidiu. Iria mesmo sair para dançar. há muito se devia isso. Adiava, adiava e sempre deixava para depois. Não, dessa vez faria diferente, iria mesmo sair para se divertir. Não ligou para ninguém, até lembrou da Sebastiana, da Jandira, porém, aquele seria o dia escolhido: sairia sozinha. Levantou ofegante do sofá, foi até o quarto, abriu o guarda-roupa e a indecisão tomou conta de sua cabeça. Com que roupa iria? Pensou em vários looks, coçou a cabeça e começou a experimentar várias combinações de roupas. Jogou todas as opções em cima da cama, espalhou sapatos pelo chão, seu quarto fervilhava como seu coração.



Vestido branco rodado e sapatilha preta foram os escolhidos para aquela noite. Tirou a roupa em que estava vestida, se enrolou na toalha e foi tomar banho. Em seu pensamento se desenhava as possíveis imagens daquela noite: Como iria chegar ao local sozinha? Encontraria alguém conhecido? Quem estaria tocando? Como seria essa primeira experiência? As cenas passavam em sua cabeça como em um trailler de um filme de ação. A água quente começou a molhar seu corpo, sentiu relaxamento e conforto, gostava de água, gostava da massagem da água em suas costas e pescoço, gostava da energia vital que ela transmitia. Para Maria, tomar banho era um ritual de limpeza, não somente de higiene corporal, tratava-se de uma limpeza mental e energética, se sentia mais leve e preparada para qualquer coisa.



Desligou o chuveiro, se secou rapidamente pois não podia perder tempo. Voltando pro quarto, outro ritual: cremes, óleos, perfumes, maquiagem, olhos bem marcados, boca vermelha, vestido branco e flor vermelha no cabelo. Estava pronta! A partir desse momento estava preparada para o desafio.



Saiu de casa feliz, ligou o carro e seguiu ao encontro da dança. Em 40 minutos chegaria ao seu destino. Já estava acostumada a longas distâncias. Em Brasília, especialmente para quem vive nas satélites, convive-se com engarrafamentos, trânsito lento e com perda de algumas horas só em trajetos. Rotina.



Chegou ao "dancing", estacionou o carro e sorriu satisfeita por estar ali. Do estacionamento já ouvia o som da flauta característico do forró pé de serra, o que a deixou ainda mais alegre. Olhou pro céu, viu que era noite de lua cheia e se emocionou com uma visão tão linda. Parou para ouvir o som da água do Lago Paranoá batendo no cais - sons renovadores - sentiu o vento acariciar seu rosto e suspirou, carinhosamente, em tom de agradecimento à mãe natureza.



Começou Maria a dançar, percebeu que estava meio enferrujada, afinal, foram quase dois meses sem prática. Dançou várias músicas e suou um suor que lubrificava sua alma. Olhava a seu redor e o que via chamou sua atenção: Ali, naquele lugar, as pessoas dançavam como em missão. Dançavam para serem felizes. Mais que isso, ali elas podiam expressar suas emoções por meio do corpo.



Dançar não era flertar. Dançar era viver. Dançando sentia cada parte do seu corpo sendo oxigenada, sentia o coração acelerado, sentia o olho brilhando, a alma ardendo e a pele suando viva. O som feito pelo Forró Lunar, a lua feita pra iluminar, a noite feita para se divertir, aquele momento feito para aquela mulher, aquele lugar nomeado por lugar-laboratório. Experiência realizada com sucesso!



Orgulho, satisfação, superação. Maria foi para casa satisfeita com os resultados obtidos em seu laboratório. Agora, dormiria com uma certeza: Queria voltar a sair sozinha para mais uma vez se encontrar. Já marcou. Seu próximo encontro será no Clube do Choro de Brasília. Maria, dance, se encante, se entregue, siga Maria!